domingo, setembro 17, 2006

Flying Bird


Finalmente acordas e percebes que o que tinhas ontem, aquilo que davas como certo, aquilo que nunca pensaste perder assim, afinal foi-se.
Sem teres dado por isso, o pássaro abriu a gaiola e fugiu pela calada da noite.
No entanto, questionas-te: “Porque fugiu? Não o alimentava? Não lhe dava de beber? Não o acarinhava? Não lhe dava atenção?” e, então, começas a perceber que a falha foi humana. Foste tu que falhaste.
O pássaro fugiu! Foi à procura de nova casa. Novo refúgio. Foi à procura de um alguém que não só o alimentasse de alpista, mas que para além dela o alimentasse de sentimentos: amor, carinho, atenção.
E afinal foste tu que falhaste.
Dói a ausência do pássaro! Ele já não canta! É menos uma alma em tua casa!
Aquilo que davas como certo, afinal estava errado. Afinal as gaiolas abrem! E uma vez abertas, cabe ao pequeno ser que as habita, decidir se quer ou não fugir. E agora percebes que dar comida e água não chegam para aquecer o frio das quatro paredes que constroem a sua casa.
Ele fugiu! E desta vez não volta.
Já fugiu uma vez. Mas a saudade, a recordação dos momentos bons que passaram quando o compraste, quando era novidade, fizeram-no voltar. A esperança de reviver esses momentos fizeram-no “perdoar-te” e reconsiderar a hipótese de regresso. Ele voltou, então. E nessa altura, de novo a novidade em tua casa, fez-te desejar passar mais tempo com ele, fez-te desejar não só alimentá-lo mas também acarinhá-lo. Mas depressa percebeste que era tudo a mesma coisa. O pássaro já não era novidade. Já conhecias as suas melodias. Já sabias com o que contar. E então desististe dele outra vez. Acreditaste que as mãos daquele ferreiro tinham arquitectado o palácio mais seguro e inviolável que qualquer ave de cativeiro poderia ter. Deste-lhe comida. Às vezes esquecias-te ou não tinhas tempo: a tua vida era complicada e consumia-te o tempo todo. Esqueceste-te de o aconchegar. As barras da gaiola não preenchiam o espaço que pensavas ser aconchegante.
Todos os dias o pássaro alimentou a ideia de que era só uma fase. Alimentou a ideia de que depois dessa fase, a tua vida se tornasse mais pacífica e que, de novo, voltassem a partilhar bons momentos.
A tua vida apaziguou, mas a fase não passou. E então, tu passaste de ocupado a despreocupado. O pássaro percebeu que não ias mudar e fartou-se.
Esta noite, fria, ventosa e intempestiva, ele abriu a portinhola que, afinal tinhas deixado aberta. Afinal tinhas-te esquecido de a trancar. Afinal nunca a trancaste desde que te tornaste ocupado. Mas o pássaro nunca quis fugir. Estava preso por vontade. Esta noite só precisou de encostar o frágil corpo à portinhola. Ela até rangeu, mas nem te deste ao trabalho de perceber de onde vinha o barulho.
O pássaro fugiu. E não volta.
Agora choras. Sentes a sua falta. Choras a partida. Nem tempo tiveste de te despedir. Dizes que nunca percebeste que era infeliz, mas ele sempre mostrou do que precisava. Lembras-te que afinal, havia já uns dias que não cantava, mas andavas tão preocupado em ver dos outros que nem quiseste saber. Afinal a presença dele na gaiola era dada como certa.
E agora não sabes onde procurar. Talvez voltes à loja onde o compraste e adquiras um novo exemplar, mas de outra espécie, porque esta é infiel e ingrata.

2 comentários:

asdrubal tudo bem disse...

grande texto. parabéns.

Anónimo disse...

ja t tinha comentado no outro dia mas axei melhor deixar uma lembrança da minha pessoa...
sim, pk eu inda sou vivo... ;)
nem tudo e mau nesta historia; e sempre melhor abrir os olhos ao prncipio do k kd estam mais coisas envolvidas...
apenas deixa-o voar...........

deste teu sempre admirador...

bjinhos

P.S.: "Flying Bird" leva-nos a concluir k n e uma avestruz.... looool ;)